O peixão extinto
16/01/15 16:16Peixe mal copiado de Goines. Em Chez Panisse Cafe Cookbook
Chegando a Oxford para um simpósio (muito bom e teórico, mas com comida impossível de ruim), fui recebida pelo Alan Davidson, o organizador, esbelto, cabelos branqueando e, querem saber?, bem bonito, inteligente, engraçado, excêntrico. Um homem genial.
Foi embaixador em Vientiane, no Laos, mas com 51 anos abandonou a carreira para escrever sobre peixes. Tornou-se um dos maiores especialistas em mares nunca dantes navegados e tudo começou quando sua mulher (eles moravam na Tunísia) pediu a ele que fizesse uma lista comparativa de peixes de lá com os da Inglaterra.
Ele aproveitou para estudar a matéria com um cientista japonês. Tem livros definitivos, excelentes, classificando peixes e dando receitas. Todos são ótimos e quem se interessar pode ir à Amazon. Além disso, compilou o “Oxford Companion to Food”, um projeto sempre em andamento, e abriu uma pequena editora.
Quando ainda em Vientiane, ele foi ao palácio do príncipe do Laos, que era conhecedor e praticante de grandes pescarias, e conversaram muito, tomando notas sobre peixes e principalmente sobre o Pangasionodon gigas, o “pabeuk”, do rio Mekong, que estava em extinção.
Na hora de se despedir, Alan Davidson lembrou-se de perguntar por quais motivos não encontrava nada escrito sobre a cozinha do Laos e o príncipe franziu a testa, pediu licença e saiu para procurar alguma coisa.
Voltou com dois caderninhos de receitas de Phia Sing, seu antigo mestre de cerimônias e chef do Palácio Real. Eram receitas autênticas e foram publicadas como “Traditional Recipes of Laos”.
Logo depois as capitais do Laos foram tomadas pelos comunistas e pelo “Khmer Rouge”, mas o livro de receitas estava a salvo.
E assim corria a vida de Davidson, ainda embaixador e com medo de ir embora do Laos e nem sequer ver o “pabeuk”, que, além de estar em extinção, trazia felicidade eterna a quem o comesse. Um grande “pabeuk” teria uns 3 m de comprimento e pesaria de 250 a 300 kg.
O mais perto que chegou do peixe foi quando ligaram para ele avisando que havia uma cabeça fresca dele e que queriam doá-la. Com inúmeras peripécias, desde helicópteros à British Airways, a cabeça de 50 kg foi parar no Museu Britânico.
Já em 1980 o ex-embaixador passeava muito por seus antigos pagos orientais com Paul Levy, escritor também, interessado em comida e inventor da intraduzível palavra “foodie”. Foram convidados para um jantar de uma sopa, num restaurante de fim do mundo, desconhecido.
Era um lugar escuro, enfumaçado, com cheiro forte de erva-cidreira e tanta pimenta que incendiava os olhos. Só havia uma mesa. Era mesmo uma homenagem. Aproximaram-se, reverentes, o cozinheiro destampou o caldeirão e avisou, orgulhoso: “Um ‘pabeuk’ ensopado!”
Talvez Alan Davidson e Paul Levy tenham sido os últimos a comer o peixão extinto que tanto haviam procurado. Azar do Museu Britânico. Paul Levy, o “foodie”, não consegue se lembrar do gosto pelo excesso de pimenta (foi o que disse.) Depois do sofrimento ecológico de ser o último ocidental a comer o último “pabeuk”, Davidson jamais comentou o assunto, desolado.
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Moema Cavalcanti Que história genial, Nina Horta! Só você mesma… Beijos.
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Moema Cavalcanti Dulce Horta, você é filha da Nina Horta? Conheço o Octávio Horta…
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Mauro David Artur Bondi Mandei para a Bia Cunha, minha mulher aventureira que está no Laos, e amanhã começa a navegar por 4 dias, rio Mecong acima….que sabe, não consegue encontrar uma sopa de “Pangasianodon Gigas” o já lendário PABEUK. Obrigado pela dica…..
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Paloma Perez Nina, sempre bom o gosto que fica de seus escritos!
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Maria Do Ceu Athayde Que bela história,Parabéns Nina Horta!
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Joaquim Alessi Texto divinamente delicioso… Obrigado por proporcionar a leitura.
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Ivan Achcar Nina Horta minha filha de 1,5 anos chama-se Nina mas é Nina mesmo, de papel passado. sou muito fã de muitas Ninas. Ouvir Nina Simone lendo Nina Horta com a Minha Nina no colo é algo indescritível. Vivam as Ninas e que o mundo encha-se delas. Das boas!
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