Livros perdidos
12/06/13 02:06Perder livros é uma coisa incrível. Acho que só acontece comigo, mas é provável que não. De vez em quando, até encomendo de novo para encontrar na estante, ali no lugarzinho onde sempre esteve.
Agora sumiu uma coisa enorme, as revistas americanas dos anos 60 em diante, encadernadas. Como explicar? Eu usava para referência de comida e de moda, a história dos pratos se modificando, o jeito de apresentá-los.
O único jeito mesmo é fechar os olhos e fingir que continuam ali, às minhas ordens. A essa altura, luto por livro não tem cabimento.
E aquele do sul da Louisiana que tinha receitas de quiabo e de uma torta de pecan que fazíamos no começo do bufê? Por sinal, consegui que alguém me trouxesse de lá o filé, folha que se usa para fazer o gumbo. Como se plantando aqui tudo dá, deve ser alguma coisa que anda aí pelos campos ou que ninguém teve interesse de plantar. Pelo que leio, serve como espessante do prato, substituindo o quiabo. Substituindo o quiabo? Só? Para quê?
Bom, só vou saber depois que experimentar no meu “taller” em tudo semelhante ao do Adrià. (O filé é feito de folhas de sassafrás secas e foi introduzida nos EUA pelos índios Choctaw.) “Who?”
Vocês se lembram quando a comida dos irmãos Prudhomme virou o que havia de moderno e chique? Era o peixe assado de um lado só, os vários pozinhos apimentados que ele industrializou.
E tinha a história de um cozinheiro de família francesa, que se refugiara lá na Revolução Francesa. Ficou conhecido pelos seus gumbos, jambalayas, bisques, que fazia à perfeição. Resolveu bolar alguma coisa muito especial para o casamento da filha logo depois da Guerra de Secessão. Prestem atenção na ideia, coisa de cozinheiro ou de decorador enlouquecido? Importou aranhas enormes e soltou-as numa aleia de pinheiros e de carvalhos que levava à fazenda onde se realizaria o casamento.
Na manhã da festa, espalhou pó de ouro nas teias criando a sensação de levíssimas malhas douradas. Todas as refeições foram feitas debaixo dessa delicadeza de sonho, produzida pelas aranhas.
Fica-se pensando que é mentira, mas que imaginação precisaria ter um mentiroso para inventar uma fofoca trabalhosa como essa?
Outro livro que perdi foi o meu primeiro de comida chinesa. Ainda não sabiam ficar inventando moda nas receitas e era simples e transparente como uma cartilha bem escrita.
O nome da autora era Grace Zhiu.Livro para débil mental, mesmo, mas eu sentia como meu porto chinês. “Why did I tell you I was going to Shangai? I’m even allergic to rice” (Por que eu lhe disse que iria para Xangai? Eu sou até mesmo alérgico à arroz). Desse tempo, tempo da Doris Day.
Mas a minha alegria não teve limites quando achei um destroçado naqueles sebos da Amazon. Não fez diferença, era ruim mesmo, mas fazia parte da minha identidade, ficava um incômodo, uma falha.
Agora, sumiram todos os meus cadernos de receitas da juventude e da vida afora. Não estou considerando perdidos, pois como foram todos devo ter posto numa sacola de plástico, numa caixa, mas está esquisitíssimo terem sumido assim em bando. E esses é “ciao, ciao”, não vai haver sebo em que os encontre.
Panta rei, tudo passa, panta de pan tudo, rei de rio, rua, passar, correr ; tudo que nasce morre, a vida é impermanência. há o desapego. o sr. Castro na A2 ho-je dá uma lista de comidas típicas brasileiras regionais que guardei rasgando a pg. A sardinha frita está lá. Muitas nem que é daqui sabe o que é.
Nina,
Nada como um bom escaner e uma cópia de segurança contra os sumiços da vida.
Agora!!!! (rs)
E no ato de escanear seus documentos preferidos, você ainda pode reviver máginificas lembranças e compartilhar cada uma delas com seus leitores.
abraços cordiais