ESTÁ NA MODA!
14/04/12 15:27As fotos postadas são de um livro que um cliente me deu. É um belo livro grosso, italiano e julguei pela fotos que fosse dos anos 50. Não, é de 1978. Vocês se lembram?
A gente sabe que comida tem moda, repete isso, mas não realiza completamente a diferença que existe de década para década. Vamos lembrar, até onde vocês conseguem chegar. Vamos partir dos anos sessenta, aqui no Brasil.
Começava-se a usar muita cerâmica, era uma coisa moderna, panelinhas, pratos de cores diferentes, modernidades impensáveis nos anos 50.
Para nos lembrarmos bem pensemos numa festa – o Natal. Minha mãe me dava a incumbência de trazer cachos enormes de coquinho e que só a Neide Rigo e o Luiz Paulo Stockler sabem o nome. Vocês hão de imaginar que não era tarefa fácil, “oi, sobe no coqueiro, tira coco,nheco, nheco, no coqueiro orirá… Papai cadê Maria, Maria foi passear..!”
No jardim havia pés de babosa. As tintas spray eram novidade e pintávamos os cocos e as babosas inteirinhos de prateado. O cacho ficava pronto, mas na babosa era preciso colocar uma bola prateada em cada ponta. Um luxo.
A comida era novidade, juro que era. O peru e o tender, o tender marcado em losangos com um cravo no meio de cada um. Claro que podia ter um peru, mas este não era tão novidade assim, com fios de ovos.
Das revistas americanas, suponho, roubavam-se as idéias de frutas acompanhando as carnes. Abacaxi em rodelas, cerejas em lata. Farofa de sempre.
Pois éramos assim em 1960.
Que eu me lembre essa moda continuou por muitas décadas apesar das sobreposições de estrogonofes e camarão no leite de coco e curry. Ainda usava-se muito juntar as frutas. Nessa mesma época a salada Waldorf, de salsão, nozes, maçãs, maionese. Nas festas de ano Novo ainda existia um restinho de reinados mais antigos com faisões com todas as suas penas e cascatas de camarões. Peguei o finzinhos dessas festas, no Jockey Club, ceia grátis de fim de ano.
Durou bastante esse tempo dos cremes de leite, dos ensopadinhos com leite de coco, dos frangos com creme, dos camarões com creme, de tudo com creme.
Custamos a escutar a palavra nouvelle cuisine, ela já começava nos 70 com Paul Bocuse e víamos aqueles pratos brancos fazendo moldura para uma comida desenhada no meio. Pouca comida, pouquíssima. Foi só no restaurante do Quentin, L´Arnaque, que comi uma série de pratos absolutamente minimalistas e entendi o conceito. Pouca comida no prato, mas muitos pratos.
Lembro direitinho do menu dele que me encantou: quatro ravióles recheados de abóbora com sálvia, esqueci o segundo e o terceiro, me lembro da sobremesa, aquela pêra cortada em saínha, ou leque sobre um creme pâtissier. Atentem, era uma inovação a sobremesa vir arrumada no prato. Antes passava aquele carrinho cheio de quindões e îles flotantes, e manjares e pudins e o garçon cortava uma fatia daquilo que você quisesse. Aqueles primeiros pratos de sobremesa preparados na hora eram uma revolução.
Os salgados começaram assim, poucos e achatados no fundo do prato, terrines coloridas de legumes, fios de molho… Tudo muito leve e sem gordura, nada de frituras que matassem o fígado, por um tempão.
Um dia uma cliente mais antiga apareceu no buffet para contar a sua viagem gastronômica pela Europa. E descrevia os pratos mas fazia um gesto com a mão como se estivesse puxando a comida para cima. Fiquei com a pulga atrás da orelha e fui pesquisar. Claro, os arranjos dos pratos tinham subido um andar, dois andares, três andares. Balançavam-se precariamente como torres de Piza, cada chef tentava uma construção mais alta.
Ainda estamos por aí, misturando o tender, o estrogonofe, os mirtilos, as caldas de frutas vermelhas, o maracujá sobre o peixe, a mandioquinha com caviar, um pouco de cada coisa que os brasileiros não são de se agarrar numa moda só. Antropófagos, mastigamos tudo e escolhemos mais ou menos aquilo que mais gostamos. Contanto que tenha uma farofinha…
Legal a matéria e os comentarios
Também tenho essa coleção completa citada acima “Coleção Bom Apetite Edição para Portugal de 1970”
Parabéns pelo post
Obrigada, só agora vi os comentários. Obrigada!
Leio a sua coluna toda quarta…viajo com as suas experiências!!!Parabéns pelo post…tenho um blog de cerâmica e gostaria de compartilhá-lo!!
Abraços
Só agora aprendi a responder. Estava respondendo pelos comentários…. Oi, Vou entrar no seu blog, preciso tanto de cerâmicas par o buffet. Vc faz coisas grandes?
Adoro!!!
Tenho a coleção original e completa da revista Bom Apetite da editora abril para Portugal.
várias referência para releituras e clássicos dos anos 60 e 70.
Abraço.
Martírio para guardar, não é? Volte!
Que saudades que deu da mae!!!!
Adorei me fez lembrar o natal la de casa
coisa boa.
Eu também morro de saudade. Volte!
Nina, não sei que gosto tem a sua comida, mas a sua prosa aquece meu coração.
Comprei um kilo de farinha, prá fazer farofa,
prá fazer farofa, prá fazer farofa FA FA…
A farofa é a própria tradução desta nação.
Tem coisa melhor.
Não tem coisa melhor. Adoro farofa, fa, fa, vc, não? Abraço.
Parabéns pelo post, me fez voltar à minha infância e juventude
Obrigada, Ricardo, ainda tem muito para lembrar dessas festas antigas do outro dia. Me manda contar suas lembranças ninahorta@uol.com.br
Acho tão engraçado esse negócio de moda gastronômica… Paladar é paladar. Mas como os outros sentidos são o canal de entrada para que a comida chegue às vias de fato, aí, sim, faz todo o sentido existir moda. Como não sou gastrônoma, posso encher os pratos de fios de ovos, rodelas de abacaxi, cortar o tomate em forma de flor sem a menor culpa de ser brega!
Tem coisa melhor do que comer o que se gosta sem preocupação? A pequena bandeira que levanto é essa, que consideremos chic e bom, aquilo que gostamos.
Outro dia fiz um cardápio ” old fashion” – file Wellington, salada Waldorf, espetinhos de frios com picles no abacaxi – fios de ovos nao, que nao suporto – morango com chantilly, hi-fi & Cuba-libre, vitelo tonné, tudo. E todos, absolutamente todos comeram e beberam, a noite foi ótima. E farofa, claro.
Pois, não é? Morangos com creme, casamento perfeito. Brega? Ora, ora, essa não. Abraço.
tenho até hoje uma coleção de fichas, que a gente punha numa caixinha plástica, que acho que chamava mil fichas. você lembra? todas, todas as receitas mesmo, tinham creme de leite.
Nem vou repetir que adoro o modo como escreve, parece que está narrando parte da minha vida.Passei por tudo isso que você comentou. Tenho saudades? Apesar de saudosista aprecio a novidade, a maneira do preparo ,muito mais fácil. Gosto de farofinha também.
Ah, uma boa farofinha fazendo tchizz no céu da boca! Abraço, volte sempre.
Pois, eu que era metida a cozinheira passei a vida tendo essas fichinhas, copiando fichinhas, horas e horas. Vou ver onde enfiei minhas fichas, deve ser interessante revê-las e enfiar o pé na jaca de creme de leite.